MEUS LIVROS

Pessoal, tenho dois livros lançados. Para adquiri-los acesse os links a seguir:

Nos trilhos do trem e outras (livro impresso) crônicas: https://editoramultifoco.com.br/loja/product/nos-trilhos-do-trem-e-outras-cronicas/

Verso e Prosa: poesias para a alma, crônicas para a vida (versão e-book): https://www.amazon.com.br/Verso-Prosa-Poesias-para-cr%C3%B4nicas-ebook/dp/B08ZY24DPG/ref=sr_1_1?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&dchild=1&keywords=verso+e+prosa&qid=1618406411&sr=8-1

Verso e Prosa: poesias para a alma, crônicas para a vida (livro impresso): https://clubedeautores.com.br/livro/verso-e-prosa-2

O QUE VOCÊ PROCURA NESTE BLOG?

CONHECENDO O AUTOR DO BLOG

O professor e escritor Marcos Cortinovis Carvalho nasceu no Rio de Janeiro, na capital, em 1975. Após estabelecer-se profissionalmente como professor, foi morar em Mangaratiba, município da Costa Verde fluminense, onde permaneceu por três anos. Atualmente reside em Itaguaí, município da região metropolitana do Rio de Janeiro, compreendida entre a Baixada Fluminense e a Costa Verde.

Casou-se em 1998, tem dois filhos e um neto. Estudou Direito, mas não chegou a se formar, trancou o curso quando iniciou o quinto ano da faculdade e, em seguida, ingressou no curso de Letras. Fez especialização em Linguística e Língua Portuguesa e cursou Mestrado, cuja pesquisa volta-se à leitura e produção textual de alunos em privação de liberdade.

É professor da Rede Estadual de Ensino do Rio de Janeiro, possui duas matrículas públicas: por uma delas, é lotado em uma escola situada em um presídio, onde, além de lecionar Língua Portuguesa e Literatura, coordena trabalhos extraclasse – o Festival de Música e o Café Literário – os quais visam não apenas o desenvolvimento intelectual dos alunos, mas também a sensibilidade artística deles; por outra matrícula, leciona Português e Literatura em Itaguaí.

Lançou-se pela primeira vez no mundo da literatura como escritor com a obra "Nos trilhos do trem e outras crônicas", em que, além de outros temas, inspira-se no dia a dia do trem suburbano do Rio de Janeiro.

Além disso, inspirou-se em cronistas pelos quais tem grande admiração – Luís Fernando Veríssimo, Stanislaw Ponte Preta, Rubem Braga e Zuenir Ventura – e pretende alçar mais voos no universo literário.

domingo, 18 de junho de 2017

Conto: Trabalhadores do Brasil, de Wander Piroli

Trabalhadores do Brasil
(Wander Piroli)

Como uma ilha entre as pessoas que se comprimiam no abrigo de bonde, o homem mantinha-se concentrado no seu serviço. Era especialista em colorir retrato e fazia caricatura em cinco minutos. No momento ele retocava uma foto de Getúlio Vargas, que mostrava um dos melhores sorrisos do presidente morto.
O homem estava sentado num tamborete rústico, com os joelhos cruzados e a cabeça baixa. À sua direita havia uma mesinha de desarmar, entulhada de lápis de vários tipos e cores, folhas de papel em branco, borrachas, tesoura e um pouco de estopa. Havia ainda uma tabuleta em cima da pequena mesa, apoiando-se na pilastra onde estavam expostos seus trabalhos: fotografias coloridas de grandes personalidades e caricaturas também de grandes personalidades.
Nem sequer a chegada do bonde fez o homem levantar a cabeça. Trabalhava variando de lápis calmamente, como se não tivesse nenhuma pressa ou mesmo não desejasse terminar o serviço. Getúlio na foto continuava sorrindo para o homem com um de seus melhores sorrisos.
Uma mulher esturrada, de alpargata e vestido muito largo, aproximou-se e parou à sua frente. O homem levantou a cabeça:
- Você, Maria.
Ela moveu o rosto com dificuldade e fez o possível para sorrir, fixando atenta e profundamente a cara do homem.
- Aconteceu alguma coisa?
- Não – murmurou a mulher.
O homem pôs a fotografia e o lápis na mesa e esperou que a mulher falasse. Olhavam-se como duas pessoas de intensa convivência.
- Não houve mesmo nada? – tornou o homem.
- Claro que não, Zé. Eu vim à toa.
- E os meninos?
- Mamãe está com eles.
- Como é que você arranjou para chegar até aqui?
- Uai, eu vim.
- A pé? Você não devia ter vindo, Maria. Estou achando que houve alguma coisa.
- Não teve nada, não. Mamãe chegou lá em casa e então eu aproveitei para dar um pulo até aqui.
- Ah – o homem sorriu. E uma onda de carinho, quase imperceptível, assomou-lhe o rosto lento e sofrido.
- Fez alguma coisa hoje, Zé?
- Fiz um – respondeu levantando-se. – Senta aqui. Você deve estar cansada.
A mulher sentou no tamborete, desajeitada.
- Você não devia ter vindo, Maria – disse o homem.
- Eu sei, mas me deu vontade. Mamãe ficou lá com os meninos.
- Mas ela não estava doente?
- Você sabe como mamãe é.
- E o Tonhinho?
- Está lá.
- O carnegão saiu?
A mulher fez sim com a cabeça e em seguida olhou para o abrigo, onde havia pequenas lojas de frutas, café, pastelaria.
- Espera um pouquinho aí – disse o homem, e caminhou na direção de uma das lojas.
A mulher permaneceu sentada no tamborete, observou por um momento o vendedor de agulhas, que continuava gritando, depois deteve a vista na foto de Getúlio Vargas sorrindo para os trabalhadores do Brasil. O homem reapareceu com um saquinho manchado de gordura.
- Esses pastéis.
- Oh, Zé, para que você fez isso?
- Vamos, come um.
- Você não devia ter comprado.
- Vamos.
A mulher retirou um pastelzinho do saco e começou a mastigá-lo com muito prazer.
- Come o outro, Zé.
- Já comi uns dois hoje. Esse outro também é seu.
- Então eu vou levar ele pros meninos.
- É pior, Maria.
O homem ficou de pé, ao lado da mulher, observando-a comer o segundo pastel. A mulher acabou de comer, limpou a boca na manga do vestido e fez menção de levantar-se:
- Fica aqui, Zé. Pode aparecer alguém.
- Não, eu passei a manhã toda assentado.
A mulher sentada e o homem em pé conservaram-se silenciosos durante um breve e ao mesmo tempo longo momento, ora olhando um para o outro, ora cada um olhando as pessoas agora espalhadas no abrigo ou não olhando coisa nenhuma. A mulher se ergueu:
- Acho que eu vou andando.
- Já vai?
- Mamãe não aguenta eles, você sabe.
- Ah, é mesmo. Você não devia ter vindo.
O homem tirou uma nota de dentro do bolso do paletó e estendeu-a para a mulher.
- Volta de bonde.
- Não, Zé.
- É muito longe, criatura.
- Não.
- Ora, minha nega.
- A mulher pegou o dinheiro com a mão indecisa.
- Vou ver se levo.
O homem assentiu com a cabeça, abriu a boca mas não disse nada. A mulher desviou o rosto e piscou os olhos várias vezes.
- Não chega tarde não, viu, Zé.
- Chego não.
- Você vai fazer.
- Hoje eu sei que vai melhorar.
- Vai sim, Zé. Eu seu que vai. Eu sei.
A mulher se afastou rapidamente, sem voltar o rosto. O homem empinou-se um pouco para vê-la atravessar a rua. Depois sentou no tamborete e pegou um lápis e o retrato.
Durante muito tempo o homem permaneceu com a cabeça baixa, imóvel dentro de sua ilha, curvado sobre a foto que mostrava o presidente morto com aquele sorriso de seus melhores dias.

Nenhum comentário:

Postar um comentário